Não sou um especialista da matéria mas, em termos de ordenamento de território, há muito tempo que intuí que a questão essencial do desenvolvimento (mais) equilibrado do País é a questão da fixação de elites. Para fixar elites, também por intuição, me parece existirem três eixos essenciais: o do conhecimento, o do poder e o das acessibilidades.
Isto é, para fixar elites nas cidades médias, que é o que arrasta a fixação das populações, importa dotar essas cidades dos meios que induzem as elites a aí fixarem-se. Isto implica que exista nessas cidades médias criação de conhecimento. Por exemplo através da instalação de institutos, pólos universitários ou universidades - o que, em parte já foi feito e com resultados conhecidos; mas poder-se-ia ir mais longe.
Isso implica igualmente que aí se criem instrumentos adequados de exercício do poder, seja ele político, social ou económico, não esquecendo o administrativo. Sobre este ponto hei-de postar novamente.
E, finalmente, implica que as acessibilidades sejam adequadas a permitir que uma valorização dos custos e benefícios de optar por viver numa cidade média não seja sempre desfavorável a uma análise comparativa com os grandes centros urbanos (cada vez mais, só Lisboa). Não apenas nas ligações rodoviárias, que são essenciais à modernidade, mas também nas ferroviárias, fundamentais para o futuro, e até nas aéreas, também decisivas em certos casos e para as ligações internacionais.
Tudo isto implica uma maneira diferente de ver o País. diferente em relação ao que tem sido habitual quer nos centros decisórios dos principais partidos, quer no centro decisório do País, o vulgarmente denominado Terreiro do Paço - não apenas o político, mas igualmente o económico e académico que dele é abusivamente dependente.
Ora, para se poder começar a pensar o País diferentemente, é necessário que as instituições do País sejam desenhadas diferentemente, sob pena de cairmos na cínica conclusão do "Gato Pardo": "é preciso mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma".
Nesta perspectiva é que me vejo chegado ao ponto que queria marcar. Parece-me que o País começa a compreender, ou pelo menos a intuir, que o modelo de desenvolvimento centralista e centralizador tem sido altamente prejudicial a Portugal. Começa a perceber-se que uma qualquer forma de descentralização é absolutamente imprescindível para haver ainda uma chance de se corrigirem alguns dos maiores excessos do actual modelo.
Um dos instrumentos que creio essencial para se alcançar uma hipótese de se vir a poder mudar Portugal, é o do sistema eleitoral. Neste, parece-me fundamental assegurar que uma representação de interesses locais e regionais é assegurada, por contraposição à lógica centralista habitual dos directórios partidários.
Julgo igualmente que esta é uma causa que deveria unir o Norte, em nome de uma outra visão do País.
Mesmo que não estejamos todos de acordo em defender uma regionalização, deveríamos estar todos de acordo sobre a imprescindibilidade de assegurar que mais "Daniéis Campelos" chegam a deputados (o caso "limiano", estarão recordados; no essencial um deputado que assegurou um orçamento de outro partido mediante contrapartidas para o seu círculo eleitoral); assegurar que o novo sistema elege mais defensores dos interesses dos círculos por onde foram eleitos e que estes são decisivos para a formação da vontade política nacional. E que são eleitos uninominalmente, para garantir que dependem do seu eleitorado para se manter no posto - e não das direcções partidárias. E que os independentes também podem concorrer.
O principal objectivo que creio poder alcançar-se por esta forma é a destruição do mito de que é um qualquer centro bem informado quem melhor toma as decisões que a todos afectam.
Os pólos de competitividade diversificados que aqui tão bem tenho visto defendidos, não dependem de uma vontade de qualquer Governo para se afirmarem. Dependem outrossim de o seu aparecimento não ser bloqueado pelos planos centrais de qualquer Governo. Dependem, por exemplo, de a discussão sobre a futura rede ferroviária nacional não ser feita apenas em função da vontade do centro em pôr a capital no mapa das cidades ligadas por TGV. Ao invés, essa discussão deveria ser feita na base de uma análise custo-benefício dos diferentes modelos de rede possíveis. Ora, isso só será assegurado quando uma parte significativa dos autores da vontade política nacional se virem "forçados" a contrapor os interesses que defendem aos interesses do centrão. Só dessa forma o debate se alargará ao ponto de permitir visões alternativas do desenvolvimento da rede ferroviária. Sem confronto não há verdadeiro debate. Sem debate não há verdadeiras escolhas. Sem escolhas não há responsabilidade (e responsabilização) política. Como se viu com a Ota.
E não se diga que o País se tornaria ingovernável dessa forma, porque os resultados da governabilidade que o sistema actual tem permitido são conhecidos de todos. E claros.
Por tudo isto já aqui apresentei o meu modelo preferido: o da redução do parlamento a 200 deputados, com 100 a serem eleitos por círculos uninominais (e os restantes num único círculo estritamente proporcional). Este poderia ser um primeiro passo da reconstrução do sistema político-administrativo do País.
E um passo que deveria interessar particularmente ao Norte, para garantir uma melhor representação dos seus interesses.
Post igualmente publicado no Nortadas
4 comentários:
Caro ventanias,
"100 círculos uninominais"
E porque não fundir as 308 autarquias do continente dando origem a apenas 100 ?!?!?!
Passareia a existir coerência entre deputado eleito e presidente de autarquia. Ou melhor, o território autarquico coincidiria com o círculo uninominal !
A fusão das autarquias seria um problema:
a_)Ninguem ia querer deixar de ser concelho, muito menos passando a pertencer ao concelho vizinho que muitas vezes é também rival.Nomeadamente, numa altura em que cada freguesia maiorzinha insiste em ser concelho.
b_)Parece-me que com concelhos maiores ia acentuar-se ainda mais a distancia entre o cidadão e o autarca. Em Espanha os concelhos são bem mais pequenos do que os nossos e a proximidade é maior (pelo menos há maior facilidade em chegar junto do autarca).
Claro que isto nem sempre é aplicavel, admito existirem concelhos que não tem razão de ser, e quando falo em concelhos falo também em freguesias.
Salem,
Os concelhos actuais foram definidos no século XIX, quando não havia automóvel, telefone ou internet.
Hoje em dia há demasiados conselhos.
Caro José Silva,
Também eu sou favorável a uma reorganização mais profunda do mapa político-administrativo do País. No essencial, a minha ideia é começar pelas freguesias, concebendo-as como "front-office" do Estado, a todos os níveis, e dotando-as de maiores responsabilidades perante uma míriade de pequenos problemas que ali poderiam ser resolvidos. Isso implicaria uma racionalização do estado e uma libertação dos cidadãos perante o peso da burocracia. Naturalmente, esse movimento teria de ser seguido por uma reorganização dos conselhos.
À partida, não me escandalizaria a sua redução. Porém, não me quero pronunciar antes de reflectir mais aprofundadamente sobre o assunto. Uma coisa é certa; parece-me essencial que qualquer reorganização assuma a diferença entre freguesias rurais e urbanas; possivelmente com consequências profundas ao nível das possíveis reorganizações dos conselhos...
De qualquer forma, nada disso é necessário ou imprenscindível para se conseguir a maior aproximação e melhor sindicância dos políticos que a minha sugestão acarreta, para não falar da redefinição da formação da vontade política no todo nacional...
Havemos de voltar a estes assuntos.
Abraços
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