Os últimos dias ficaram marcados por 2 entrevistas de residentes na AMPorto ligados ao urbanismo: Nuno Portas na Câmara Clara da RTP e Paulo Morais no JN.
Nuno Portas trouxe novidades para leigos como eu:
- Os centros das cidades estão a ser dominados pelos «Cityusers», estudantes Erasmus, turistas e profissionais estrangeiros temporáriamente habitantes. Referiu-se a Barcelona com exemplo. Questiono se o Porto não começa a sofrer o mesmo com Ryanair. Será que a Cmporto tem consciência disso ? Duvido.
- Urbanização difusa: Das antropológicas proximidades com a Galiza, permanentemente e poeticamente difundidas em vários pontos, Nuno Portas verificou que afinal na urbanização (pelo menos) o Norte de Portugal é diferente da Galiza. Alias, penso que o Norte de Portugal é excepção no conceito de cidades. As fronteiras estão mal definidas e os centros estão dispersos.
- Fusão de municípios: Nuno Portas foi também aqui visionário ao referir que a solução para os problemas de urbanismo passam pela cooperação voluntária entre municípios vizinhos. Não referiu fusão, mas quase.
Paulo Morais, ex-vareador de Urbanismo da CMPorto escreveu novo artigo sobre o suposto buraco negro da democracia Portuguesa: O Poder Local e o tráfico de influências no licenciamento urbano.
Vejamos os equívocos.
- Equívoco 1: «Sector da gestão pública onde comummente se adivinha tráfico de influências, cheira a corrupção e se antevê o conúbio entre o poder autárquico e os interesses dos directórios partidários. O núcleo central destes negócios é constituído, sem excepção, por terrenos onde se constrói o que se não devia (jamais o contrário) e por edifícios com dimensões e volumetrias acima do permitido e do aceitável (e nunca o inverso).» Além de incoerente um liberal defender a regulamentação estatal em materia de ordenamento urbano, Paulo Morais parte do pincípio que as pressões, iniciativas, manobras dos promotores imobiliários para suprir as regras camarárias são por si erradas. Não concordo. Quem garante que os PDM são adequados ? Um PDM concebido há 10 anos é apropriado ao mercado imobiliário de hoje ? Não necessariamente. Basta ver a evolução que o mercado teve em virtude da adopção do Euro e no boom do crédito hipotecário. E daqui por 10 anos, quem nos garante que a actual crise permanecerá ? E se como bem refere Nuno Portas, Porto, Braga ou Aveiro forem povoadas por novos residentes estrangeiros, os PDM actuais serão aplicáveis ?
- Equívoco 2: «Enchem-se os bolsos de alguns e inferniza-se a vida de todos - com a sobrecarga das infra-estruturas públicas, com ruas que se degradam, tubos de saneamento que rebentam, passando ainda por um trânsito cada vez mais caótico ou pela completa devastação de áreas verdes e protegidas.» A população Portuguesa mantem-se nos 10 milhões há bastantes anos. Se há pressão urbana é porque há procura de certas cidades em deterimento de outras. A Promoção Imobiliária apenas responde há procura. E se abusa ou é cega na busca de oportunidades de negócio sem mercado, acaba por falir. Deve-se sim responsabilizar quem administra o território nacional por concentrar em algumas poucas cidades os factores de desenvolvimento que atraiem populações. Adicionalmente a taxa de urbanização em Portugal ainda está abaixo da média europeia. Portanto, não se pode responsabilizar o sector imobiliário pelo transito ou pressão na infra-estrutura.
- Equívoco 3: «Os pelouros de urbanismo das câmaras municipais deveriam planear o território em função do interesse colectivo. Raramente o fazem; pelo contrário, a elaboração dos planos directores municipais e as suas revisões parecem funcionar como bolsas de solos, em que se beneficiam com capacidade construtiva terrenos de amigos e financiadores do partido no poder. » Acredito que seja verdade, isto é, que a «bolsa de solos» funcione. Mas isto é um caso de polícia, nada mais. Mas o mais grave é a existência de PDMs à escala municipal, como se as cidades a Norte de Portugal não tivessem a tal urbanização difusa que Portas refere. Faz sentido os PDMs municipais na AMPorto ? Faz sentido mais de 300 autarquias no continente ? Claro que não.
- Equívoco 4: «O exemplo recorrente e mais escandaloso é o da reclassificação, ao longo do país, de terrenos na reserva agrícola, sempre que estes pertencem ou são adquiridos por quem detém o poder ou dele está próximo. A atribuição sem critério de capacidade construtiva valoriza estes terrenos de forma exponencial, aumentando o seu preço em cerca de 30 ou 50 vezes.» Outro equívoco: Por cada urbanização de terrenos da RAN desertifica-se o dobro ou o triplo nas zonas rurais, criando novas RAN. Novamente o problema é planeamento do desenvolvimento do território nacional e não planeamento municipal. Isto é uma tarefa da administração central.
- «Acresce, finalmente, que a fiscalização de obras é uma fraude, a Inspecção-Geral da Administração do Território é inoperante e a Justiça parece não querer funcionar»...«Muitos políticos e dirigentes praticam os actos administrativos que os poderes públicos lhes conferem em benefício de quem os financia - e não ao serviço do povo a quem devem fidelidade. Muitos vereadores do urbanismo remetem-se, assim, à posição de mercenários, a soldo de um polvo que verdadeiramente domina o país. »...«Se o urbanismo e o ordenamento do território constituem o verdadeiro ovo de serpente da democracia portuguesa, por que motivo se não altera o perverso quadro legislativo e normativo vigente? Bastaria que o Parlamento para tal tivesse vontade. Mas os nossos (?) deputados mais não são do que marionetas nas mãos dos dirigentes partidários; e estes, os líderes partidários, não querem - ou não podem - de facto alterar esta situação. Preferem ter os seus representantes autárquicos sob permanente suspeição, do que impor um regime de seriedade. Pois este desagradaria aos financiadores dos partidos e da vida política, afinal àqueles a quem devem a sua (fraca) liderança.» Para o fim Paulo Morais começa a acertar. Começa a perceber que a origem deste estado das coisas não tem haver com o Poder Local mas sim com o Central. Efectivamente IGAT e Sistema de Justiça são competência da administração central de Lisboa. Percebe e bem que os vareadores de urbanismo são «funcionários» dos seus financiadores com conivência das direcções do partidos em Lisboa. Estas vivem do voto e dos financiamentos das distritais e concelhias. Portanto não vão matar a galinha nem mudar o sistema.
Paulo Morais diaboliza apenas a face visível e final do problema e ignora que a fragmentaçao da gestão do território nacional e respectiva criação de redes mutuamente dependentes (autarcas alimentam directórios e estes toleram tráficos de influências), promovida por Lisboa há muitos séculos é a verdadeira causa. Paulo Morais escreveu um livro intitulado «Mudar o Poder Local». equivocou-se na Geografia.
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