20080108

DOURO: A PORTA DO DESENVOLVIMENTO ABRE POR DENTRO

Surpreendente paradoxo: a região vitícola demarcada mais antiga e que produz um dos vinhos mais famosos do mundo é uma das menos desenvolvidas do país. Dois indicadores apenas para ilustrar esta afirmação: o PIB per capita (2003) e o Índice de Poder de Compra Concelhio (2004) são os 5º piores do continente (em 30), representando, respectivamente, 67% e 64% da média nacional.Claro está, o Douro mudou muito nos últimos vinte anos. A melhoria das condições de vida da sua população é indiscutível. Existem hoje mais e melhores infra-estruturas básicas e equipamentos colectivos. O dinamismo empresarial em sectores como a vitivinicultura e o turismo é inquestionável. Mas nada disto pode fazer esquecer o problema essencial: o esvaziamento demográfico. Entre 1981 e 2001 a região perdeu 5 habitantes por dia, tendência que se manterá nas próximas décadas, embora a um ritmo mais lento (2 a 3 habitantes). A confirmarem-se as projecções do INE, em 2050 o Douro terá pouco mais de 150 mil habitantes, menos de metade da população registada em 1960.Esta situação surpreende não só porque o Douro possui um conjunto de recursos e de potencialidades ímpares mas também, ou sobretudo, porque a região tem vindo a ser contemplada, desde o início dos anos oitenta, com vários programas de desenvolvimento territorial, os quais canalizaram para o seu seio um volume de investimentos públicos e privados superior a 2,5 mil milhões de euros. Daí a inevitável interrogação: o que impede o desenvolvimento da região? E como justificar a relativa falta de eficácia destes programas?Vários argumentos têm sido invocados para responder a estas questões.O primeiro é o do “abandono político” e remete para a insuficiência dos investimentos públicos necessários para resolver os difíceis e históricos problemas da região. Como parece ficar demonstrado pela eloquência dos números, este argumento não vinga. Mas é verdade que as estratégias e as opções nem sempre têm sido as melhores, tendo-se privilegiado quase sempre o “betão” em detrimento da dimensão imaterial do desenvolvimento: formação, iniciativa, organização e inovação. Muito por culpa do Estado central que insiste numa visão paternalista e burocrática do desenvolvimento e que continua a pretender abrir por fora a porta do desenvolvimento, como se fosse possível desenvolver o que quer seja sem a vontade, a participação e o empenho dos potenciais interessados.O segundo é o da “lógica extractiva” das actividades económicas predominantes e remete para a transferência para fora da região das mais valias económicas e financeiras aí geradas. Este argumento tem um fundo de verdade. Mas o que seria o Douro sem os de “fora”? Parte do sucesso conseguido na vitivinicultura deve-se a eles. E se o seu contributo para o desenvolvimento da região não é maior, importa conhecer as razões e os eventuais obstáculos e remove-los. Nunca como agora houve tantos “forasteiros” interessados em investir no Douro. O que é preciso é que os durienses aproveitem também as oportunidades de negócio e de investimento, contribuindo para a criação de riqueza e de emprego imprescindíveis para o desenvolvimento da região.Finalmente, o terceiro é o da “sonolência” e remete não só para a insuficiente capacidade de empreendimento e de iniciativa mas também de organização, de concertação e de cooperação dos agentes locais e regionais. Para além de verdadeiro, este é talvez o argumento mais importante. A passividade, o individualismo, as rivalidades ou a aversão à negociação e ao compromisso, tão recorrentes no Douro, impedem que a região se una em torno de uma ambição colectiva e de um projecto de desenvolvimento mobilizador.O que falta ao Douro, aos seus agentes, aos seus líderes e às suas organizações, é uma nova atitude face ao desenvolvimento. Uma atitude que deve assentar num princípio simples: o desenvolvimento do Douro depende essencialmente dos durienses. Sem esta atitude, o risco de se perder a oportunidade criada não só pelos meios financeiros que continuarão a ser canalizados para a região mas também pelos inúmeros projectos e iniciativas já anunciados ou em gestação é enorme. Serão capazes os durienses de abrir definitivamente a porta do desenvolvimento? Quem foi capaz de construir uma das paisagens mais singulares e grandiosas da humanidade tem o dever e a obrigação de o fazer.

Sem comentários:

Leituras recomendadas