Frequentemente se ouve falar de um rumor, que podendo não ser verdadeiro, relata uma decisão tomada já há algum tempo pelas elites nacionais, de acordo com o qual estaria "demonstrado" que na Península Ibérica só haveria lugar para três grandes metrópoles: Madrid, Barcelona e Lisboa. Essa ideia seria assim o fundamento para se investir fortemente na região da capital portuguesa, procurando manter as condições de afirmação dessa cidade nacional no contexto ibérico.
Em tempos tive conhecimento de um outro rumor que acrescentava a essas três metrópoles, como motores de desenvolvimento, os eixos Valência-Alicante e Porto-Corunha.
A realidade demonstra claramente, do lado português, qual tem sido a opção dos nossos governantes. Do mesmo modo, também deixa claro quais são as consequências dessa opção para o resto do País, a começar pelo Porto mas sobretudo a acabar no interior. (Ao passo que em Espanha as cidades médias se tem conseguido afirmar, com notável vitalidade...)
Perante isto, que dizer?
Na minha perspectiva, há que reconhecer em primeiro lugar que as coisas não se passaram assim por exclusiva responsabilidade do Terreiro do Paço. Muita da culpa do que foi feito e do que não se fez cai claramente nos ombros das elites nortenhas, mas não só, pelo silêncio e passividade com que encararam as consequências da opção atrás referida. Se fosse necessário especificar, daria um único exemplo: foi necessário que a CIP assumisse a contestação pública à Ota para que instituições do resto do País, incluindo o Norte, assumissem o seu direito a participar no debate!!!
Depois, há que assumir a necessidade de levar mais longe o reequilíbrio do discurso, das opções e dos investimentos públicos, porque é desses que estamos a falar, para se promover uma outra ideia do País, que possa aproveitar mais plenamente o potencial do seu território, das suas cidades e das suas gentes.
Creio ser apenas neste contexto que faz sentido o debate que aqui no Norteamos se tem aprofundado, sobre as formas de intervenção política para promoção dos interesses, neste caso do Norte. Desde já quero deixar claro que considero que todas as opções são válidas e que, numa democracia saudável, é natural que diferentes pessoas optem por diversos instrumentos de participação cívica. Dito isto, discordo da noção de criação de um partido regional ou mesmo regionalista. Passo a explicar.
A política deve ser dominada por uma ideia transformadora da realidade, no sentido desejado, que se consubstancie em outros tantos projectos susceptíveis de promover a mudança em concreto, capazes de constituirem os pilares em que se realiza a tal ideia transformadora. Por conseguinte, qualquer partido político que se esgote no objectivo de concretização de um qualquer desse projectos, como é o caso da regionalização, não reúne em si as condições de mobilização necessárias à transformação da realidade. A não ser que a ideia transformadora seja a independência de uma dada região. Caso contrário, faz mais sentido promover movimentos cívicos, de preferência suprapartidários, que reúnam todos os que comungam dessa prioridade, independentemente de outros projectos ou objectivos.
Pela minha parte, estou convicto que o mal não é apenas do Norte ou do Interior. O mal é do País. A vários níveis. Desde logo, creio que as grandes metrópoles urbanas acarretam consigo um conjunto alargado de problemas que, em muitos aspectos, ameaçam destruir elementos essenciais do modelo de vida ocidental na versão europeia - penso nos novos guetos, nos focos de exclusão social e económica, na marginalidade criminosa, etc.
O Portugal com que sonho, é um País em que as grandes urbes são desconstruídas e reconstruídas, com o objectivo de recolocar os cidadãos no centro da coisa pública, numa lógica de proximidade.
Com projectos concretos, de que já abordei muitos nomeadamente aqui; por exemplo, recentrar a relação do cidadão com o Estado nas juntas de freguesia ou em associações destas, com inspiração no modelo das lojas do cidadão, mas aperfeiçoado no sentido de um verdadeiro "front-office" do Estado, um "ponto único de contacto" onde o cidadão trata de todas as suas questões públicas.
Esse nível administrativo seria também o adequado para resolver as questões da segurança - uma esquadra -, da escolaridade básica, pré e pós-escolar (pré-primária, primária e tempos livres), da saúde (através de centros de saúde ou médicos de família), e do apoio à terceira idade. Com capacidade para organizar, gerir, contratar e despedir.
Isto implica uma descentralização séria e aprofundada, com atribuição de competências e meios de financiamento adequados, obviamente à custa do Estado central e desconcentrado. Com diferenciação entre freguesias urbanas e rurais.
E por aí acima. Com reorganização das competências municipais e criação de regiões. Por exemplo, no sentido de as Câmaras serem responsáveis pelo ensino do segundo ciclo, que é aquele que prepara para a Universidade ou para a profissão. Por exemplo, onde as regiões são responsáveis pelo ensino do terceiro ciclo, investindo, por um lado, na investigação que assegura o futuro e a integração na economia global, nos planos nacional e internacional, e, por outro lado, preparando os seus filhos para as profissões que a economia da região solicita.
Sempre à custa do Terreiro do Paço. Sempre no sentido de aproximar as capacidades decisórias dos centros dos problemas e das pessoas. Sempre com as regiões mais ricas do País a financiarem as menos ricas, que é a única forma que conheço de se financiar a coesão nacional.
Nesse meu sonho, o País atinge a modernidade não porque tem uma cidade igual às dos outros, mas porque tem uma rede de cidades onde as pessoas gostam de viver e beneficiam das excepcionais condições geográficas e climáticas do território nacional, onde a segurança é organizada pelos interessados, onde as escolas se preocupam em aproveitar ao máximo o potencial do nosso maior recurso, que são as pessoas, em ligação próxima e coordenação com a economia real, onde a saúde é assunto dos interessados, organizada pelos próprios, onde as estradas são feitas porque são necessárias e não quando sobram recursos no Terreiro do Paço, etc.
Enfim, um País melhor porque mais Humano. Um País mais eficiente, porque o Estado está mais próximo.
Por tudo isto, e tudo o mais que fica por dizer (para já), acredito que o instrumento para transformar Portugal são os partidos políticos nacionais. No meu caso, escolhi o CDS. Em breve começarei a dar publicamente a cara por estes sonhos.
É possível um Portugal melhor. Basta querer!
3 comentários:
Caro Ventanias,
1. Concordo consigo: Perante o modelo unipolar de Portugal, defindido por Cavaco desde os anos 90, o Norte calou-se, esperando infantilmente que não fosse afectado...
2. A contestação anti OTA começou muito antes da CIP. Eu o Blasfemias, Rui Moreira entre outros, começamos na blogosfera a questionar já em 2006.
3. Partido Regional não significa necessariamente partido limitado à Regionalização nem significa necessariamente partido dedicado únicamente à região Norte. Na minha opinião, deverá significar apenas a defesa do desenvolvimento de todas as regiões excepto aquela que não precisa de defesa...
4. Volto a concordar: É necessário descentralizar competências de desenvolvimento económico e social para as regiões ou autarquias fundidas, sempre à custa da administração central. Esta que fique com as funções de Estado, que já não são poucas: Finanças, Defesa, Segurança, NEgócios Estrangeiros, Justiça.
5. Há que reconhecer que dentro de todos os partidos há vozes como a sua que alertam para as nossas causas. Há também que reconhecer que muitos dos não filiados na polítca sentem que a oferta partidária não é suficiente. Deixemos o mercado funcionar também neste assunto.
Cumprimentos
Caro José Silva,
Se reparar, eu escrevi "contestação pública assumida pela CIP". Sei bem, e fui também um dos contribuintes, já do tempo do Governo PSD-CDS, da contestação à Ota na blogosfera. O que não impede que afirme o que afirmei.
Gostaria de voltar às questões que aponta no seu 4º ponto, porque merecem muito debate; concordo no essencial, mas gostaria de acrescentar mais algumas reflexões.
Até breve
José Silva,
Penso que poderia fazer sentido convidar o Francisco Lopes, do "Regionalização" para comentar tb aqui no Norteamos. Ainda nos falta um "postador" transmontano...
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