Criados em 1979, os Gabinetes de Apoio Técnico (GAT) são porventura uma das instituições mais originais concebidas em Portugal nas últimas três décadas, tendo prestado um serviço público de excelência e um inestimável contributo para a afirmação e consolidação do poder local democrático.
O conceito e o modelo foram desenvolvidos na Comissão de Coordenação da Região Norte, então presidida pelo Professor Luís Valente de Oliveira, e posteriormente aplicados em todo o território nacional. A ideia era simples: garantir aos municípios as competências técnicas indispensáveis para a construção de infra-estruturas básicas e dos equipamentos colectivos essenciais para a melhoria das condições de vida das populações locais. As carências e os desafios eram enormes. Os municípios não tinham recursos humanos qualificados, nem tão pouco capacidade financeira para robustecer os seus quadros técnicos. A solução preconizada permitia resolver o problema, dotando-os com estruturas polivalentes (engenheiros, arquitectos, topógrafos, etc.) intermunicipais que tinham por missão elaborar projectos e acompanhar a execução das obras. E era original na medida em que o Estado (através das Comissões de Coordenação Regional) assumia os encargos com o pessoal e a administração local assegurava as despesas e a sua gestão corrente.
Durante os anos oitenta, os GAT tiveram a sua época de ouro. A quantidade e a qualidade do trabalho desenvolvido granjearam-lhes um prestígio local e nacional ímpar, assumindo o papel de verdadeiras escolas de formação e de agências de desenvolvimento territorial. Para isso muito contribuiu o facto de agregarem no seu seio dirigentes e técnicos experientes e competentes (na grande maioria oriundos das ex-colónias) e jovens licenciados entusiastas e motivados. Mas também uma postura institucional exemplar, marcada pelos valores de serviço público e pelo equilíbrio nas relações com a administração central e os municípios.
Por razões várias, na década seguinte perderam parte do seu protagonismo e do seu importante papel de articulação institucional. Por um lado, as carências técnicas dos municípios foram em grande parte supridas pelo reforço dos seus quadros técnicos ou pelo recurso a gabinetes privados. Por outro lado, os conflitos, muitas vezes de natureza política, entre os autarcas e entre estes e os governos condicionaram a sua actividade, esvaziando-os de recursos e competências e conduzindo mesmo ao encerramento de alguns deles, sobretudo a sul do Mondego.
No caso do Norte, os GAT mantiveram, até há alguns anos atrás, praticamente intactas a sua vitalidade e a sua reputação institucional. Em grande parte por mérito próprio, já que souberam conquistar e preservar a confiança dos autarcas, diversificar as suas áreas de intervenção e abraçar novas causas, como, por exemplo, a dinamização das associações de municípios, muitas das quais germinaram no seu seio. Mas também porque tiveram a sorte e o privilégio de, durante largos anos, ter na presidência da Comissão de Coordenação um homem, o Eng. Luís Braga da Cruz, que soube como ninguém interpretar o espírito original dos GAT e valorizar as suas funções de apoio técnico e o seu papel de intermediação institucional. Não é pois de estranhar que, nos finais dos anos noventa, 11 dos 12 gabinetes iniciais estivessem ainda activos (Bragança, Moncorvo, Chaves, Vila Real, Lamego, Amarante, Penafiel, Guimarães, Braga, Viana do Castelo e Valença) e que o seu quadro de pessoal rondasse os 600 funcionários.
Vista do Terreiro do Paço, esta realidade sempre pareceu algo anacrónica. Num país plano como deve ser o nosso, não há lugar para qualquer tipo excepção ou de especificidade. Várias foram as tentativas para acabar com os GAT, ou o que restava deles no Norte e, em parte, no Centro. Os primeiros embates não foram bem sucedidos porque as resistências foram muitas e os argumentos convincentes. Mas a ameaça de morte abalou definitivamente a sua estabilidade e o seu dinamismo, provocando o seu declínio e o seu esvaziamento.
O anúncio do seu fim, ao que tudo indica em Junho próximo, em nome de uma pretensa racionalização de serviços e de recursos, não é pois uma surpresa. Para os municípios que conviveram com eles durante quase três décadas a perda vai ser enorme. Mas também para a própria administração central que perde assim uma plataforma de diálogo e de concertação com as autarquias locais. Perde o país, perdemos todos. Se me é permitido, gostaria apenas de fazer um pedido a quem de direito: não se esqueçam de, ao menos, agradecer e homenagear as mulheres e os homens que ao longo destas três décadas serviram nestas instituições, com dedicação e profissionalismo, a causa do desenvolvimento local e regional.
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