20080608

Regionalizar, porquê e para quê

Tenho lido aqui muitos argumentos em defesa do Norte e, as mais das vezes, por causa dessa defesa, em favor da regionalização. Eu não sou a favor da regionalização por causa do Norte, mas antes por causa do País.

Sou do Norte, orgulho-me disso e tenho pena do que lhe tem acontecido nos últimos anos. Mas também não dúvido que o Norte tem muita culpa no que lhe sucedeu e no que sucede ao País; que mais não fosse, por não ter assumido a defesa de um outro modelo. Sobretudo o Porto, que como segunda cidade do País e principal do Norte, tinha o dever, a responsabilidade e mesmo a obrigação de ter combatido a centralização do País em todas as ocasiões. A começar no referendo.

Dito isto, explico porque sou a favor da regionalização. Não acredito em sistemas democráticos centralizados. Penso que a essência da democracia exige sindicabilidade - quer dizer, a possibilidade de escrutinar o exercício do poder por quem foi eleito, de o julgar e de votar em consequência. Ora, a sindicância é tanto mais fácil quanto os níveis de poder forem próximos dos problemas e das pessoas. Creio igualmente que foi a opacidade do sistema político-partidário, e eleitoral, nacional que permitiu a inexorável centralização a que assistimos nas últimas décadas. Mas também não duvido que o problema já vinha de traz, de há muito tempo.

Acredito igualmente que no mundo actual, e no futuro ainda será mais assim, as capacidades de resolver a generalidade dos problemas da vida em sociedade podem ser encontradas em cidades de dimensão média; já vivi em número suficiente dessas cidades para ter a certeza disso.

Ora, a centralização distorce a capacidade de apreciação da urgência dos problemas dos cidadãos, na justa medida em que a presença de um maior número de eleitores perto do centro parece tornar os seus problemas mais importantes do que os dos demais cidadãos.

Daqui decorre a necessidade de regionalizar. Precisamente na medida em que se criem novos centros de poder, dotados desse poder e dos meios que o acompanham, a resolução dos problemas dos cidadãos irá sobrepor-se às opções políticas mais duvidosas, sobretudo às megalómanas.

Acresce que essa criação de novos, e múltiplos, centros de poder, cria quase inevitavelmente concorrência entre esses centros de poder. Não só pelos recursos escassos do País, mas também quanto às soluções para os problemas. E as vantagens deste argumento não serão menores; alguém duvida que se o País estivesse organizado em 7 (5+2) regiões autónomas, se teria controlado o défice da Madeira muito mais depressa? Alguém questiona que a construcção de autoestradas teria sido muito mais equilibrada em todo o território, caso este estivesse regionalizado e a competência para construir autoestradas também? Quem acreditará que se teriam desperdiçado as centenas de milhões de euros que se desperdiçaram, na modernização da linha do norte, se não tivesse sido centralizada na CP?

Mas há ainda um outro argumento mais forte. Sem dinheiro, não há poder. E o dinheiro do Estado vem dos impostos. Se a sua utilização estiver centralizada, é muito mais difícil perceber o que acontece a esse dinheiro; se ainda por cima os serviços que recebem esses fundos também forem centralizados, então é quase impossível perceber o que acontece a esse dinheiro.

E por aqui é que eu me converto à regionalização. Se as competências, e os fundos, estiverem regionalizados é mais fácil perceber o que é que os políticos fazem com eles. E portanto, sindicar as suas opções. Além de que poderemos comparar as diferentes opções feitas por outras tantas regiões. Desse modo se promoverá o aparecimento de soluções mais eficazes e eficientes, sobretudo do ponto de vista da relação custo-benefício.

Creio ser desse tipo de criação-destrutiva que o País precisa. Sem isso será quase impossível reduzir o peso do Estado e finalmente libertar o poder inovador, resolutor e criador dos portugueses. Sobretudo num contexto cultural de hiperdependência em relação às soluções colectivas.

Por conseguinte, o que eu defendo não é a luta de uma parte da Nação contra as outras, nem muito menos a discriminação positiva de uma parte da Nação a partir do centro, ou pior ainda a destruição da Nação ,por causa da insatisfação de qualquer dos grupos seus componentes.

O que defendo é uma melhoria das condições de vida da Nação, através dos instrumentos ao nosso alcance. Defendo que a Nação se reorganize, se organize de formas mais inteligentes, mais descentralizadas, mais próximas dos cidadãos - numa palavra, mais Humanas. Mate-se o centralismo, e morrerão os interesses do centrão. Destrua-se a centralização e o País se reequilibrará.

Não creio que faltem símbolos. O que faz falta não é sublinhar a diferença, nem mobilizar os descontentes contra seja quem for.

O que é preciso é acreditar que é possível um Portugal melhor. E apresentar projectos para se chegar lá. Afinal, as ideias não custam dinheiro. E se forem boas, em democracia certamente que encontrarão o seu mercado. Por isso costumo afirmar que para termos um Portugal melhor, basta querer.

E querer, é poder.

2 comentários:

Jose Silva disse...

Caro Ventanias,

Reconheço que nem sempre o meu discurso tem a precisão ou a pedagogia que devia ter.

Não partilho do seu optimismo relativamente à mudança. O poder conquista-se. O status quo só será afrontado se houver frontalidade verbal.

Onde sou optimista é no facto de a Norte, onde me situo e onde tenho informação e conhecimento, lentamente as elites e as massas tomam consciencia da situação. É um processo muito lento para a minha paciência, mas tem estado a decorrer. E depois desta consciencialização o resto será mais fácil.

Ventanias disse...

Sem dúvida, meu caro José Silva. E creio mesmo que essa consciencialização não está a acontecer só a Norte. Pelo menos em relação à necessidade de procurar outras vias, alternativas, que aproximem os cidadãos das soluções.

Quanto ao optimismo, foi uma escolha que fiz à muito tempo e que me esforço por manter, conscientemente.

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