Primeiro, subscrevo, quase na íntegra, o que cita o José Silva aqui abaixo, do Miguel Alves. Segundo, acho que é possível e desejável ir mais longe. Desde logo recuperando as virtudes descentralizadoras, ou melhor, anti-centralistas da regionalização. Depois, aproveitando as virtudes apontadas da nossa tradição municipalista. Finalmente, e é este o ponto deste post, recriando o conceito de bairro a partir dessa figura simbólica e desprovida de poderes da Junta de Freguesia - também o José Silva tem apontado essas virtualidades e não quero aqui tirar-lhe a "paternidade" da ideia.
Creio que muitos dos problemas organizativos da sociedade moderna podem e devem ser entregues a uma unidade territorial próxima da freguesia, numa espécie de modelo de auto-gestão cooperativa. Falo da esquadra, da escola, do centro de apoio à terceira idade e do centro de saúde (mas admito que haverá outros exemplos)
Deveríamos ser capazes de reorganizar a nossa vida colectiva de modo a podermos entregar a gestão daquelas estruturas a um nível próximo da freguesia actual. Acho que para isso era essencial definir o que são freguesias urbanas e rurais. Obviamente aquelas comportarão maior número de cidadãos, estas últimas deverão ter algum limite geográfico e não apenas basear-se no número de cidadãos para a sua constituição.
Ainda assim, na falta de outros dados mais aprofundados, basear-me-ia nos números apresentados para o caso dinamarquês, pelo José Silva: 40 mil cidadãos por freguesia parece-me um número razoável para criar essas novas freguesias (urbanas). Chamêmo-lhes comunas.
Essas comunas seriam responsáveis pela gestão e organização daqueles centros de resolução de problemas. Seriam financiadas de acordo com o respectivo custo médio por cidadão, deduzido de uma verba marginal para financiar as competências que, nestas matérias, houvesse de conservar-se a nível central. No mais, as novas comunas seriam responsáveis. Desde que assegurassem a prestação do serviço aos seus cidadãos, poderiam criá-los elas próprias, contratá-las a terceiros ou até privatizá-las, ou ainda organizá-las em parceria com outras comunas.
Teriam o poder de contratar os respectivos técnicos - admitindo que as esquadras tivessem de ser dirigidas por alguém de um corpo nacional, nada impede que o número de polícias, administrativos e demais funcionários, não fosse decidido no âmbito da própria comuna. O mesmo se diga para as escolas, ou os centros de terceira idade e de saúde. E porque não, um primeiro nível de justiça para pequenas questões.
Possível e talvez desejavelmente, cada um desses centros de resolução de problemas deveria ser dirigido por um cidadão, qualificado ou não, eleito pelos constituintes da comuna.
As próprias comunas, ou mesmo as actuais freguesias, poderiam e deveriam ser organizadas como verdadeiros "front-offices" dos serviços do Estado. De todos. Receberiam as questões, declarações e demais intervenções necessárias dos cidadãos, encaminhá-las-iam para os serviços competentes - os "back offices" - para finalmente receberem e entregarem as respostas.
Tudo isto e muito mais poderia ser feito com facilidade, assim houvesse vontade. A tecnologia para o pôr em prática está aí. Os custos, estou em crêr, seriam substancialmente reduzidos em relação a esta máquina superpesada do Estado central actual; mesmo que não fossem, pelo menos a utilização desses recursos seria mais próxima dos seus destinatários, que assim teriam mais controlo sobre eles. A fiscalização também seria facilitada.
Sobretudo, um Estado organizado de acordo com estas linhas mestras, seria muito mais HUMANO; porque mais próximo; porque mais nosso; porque nos responsabilizaria mais directamente pelo seu funcionamento; porque nos libertaria para procurar soluções novas e diferentes.
Creio que não será pedir muito, aos generosos leitores, que imaginem o que estas linhas mestras poderiam significar para outros níveis de poder descentralizado - local; como os munícipios. Ou regional, como nas regiões.
Ao Estado central ficariam as tradicionais competências ditas de soberania e as de fiscalização; por exemplo a organização de exames nacionais.
É possível um Portugal melhor. Basta querer. (E não é preciso 10 ou 15 anos para o fazer)
5 comentários:
Caro Ventanias,
O problema é que as organizações do tamanho das autarquias não conseguem resolver problemas como a gestão do ASC, poluição da refinaria de Leça, upgrade da linha do Douro, desmascarar a falácia do esgotamento da Portela ou definição de regras para as verbas do QREN não sejam drenadas para LX. Tudo isto são problemas para serem tratados ao nível de regiões tradicionais ou autarquias fundidas. E quanto a mim é aqui que o Norte perde, e não nos serviços camarários à 3ª idade, arruamentos ou fomemto cultural. Ninguem se queixa disso. Bem ou mal as autarquias cumprem o seu papel.
Peço desculpa, caro José Silva, mas discordo absolutamente.
O problema está na distribuição das verbas, que é como quem diz do poder.
Os problemas de que fala, naturalmente teriam de ser resolvidos em níveis superiores de administração. Possivelmente reegiões - sejam constituídas por associações de municípios ou com base nas actuais regiões plano.
No entanto, a atitude cultural que poderia basear qualquer movimento anti-centralista teria de vir de baixo, creio. E daí a minha referência às "comunas". Pense, por exemplo, no que aconteceu recentemente com a reorganização das urgências... se as mesmas mudanças tivessem sido promovidas de baixo para cima, não teriam provocado a contestação que provocou, e as soluções poderiam ter sido muito mais flexíveis, que é como quem diz, mais adaptadas à realidade local.
Não se pode, creio, ser anti-centralista só para algumas coisas... sob pena de cairmos nos pequenos centralismos locais (Madeira, por exemplo, vem à memória...).
Por conseguinte, creio que as autarquias tem "pouco papel" e poderiam ter outros muito mais relevantes.
Caro Ventanias,
1. Obviamente, não precisa de pedir deslcupa para discordar :) Ás únicas regras do Norteamos é a defesa do desenvolvimento a Norte e lutar contra os que criam obstáculos a esse desenvolvimento.
2. Vejamos: OK, os SAP poderiam ser geridas/decididas ao nível das autarquias. Porém, algum teria que tomar decisões sobre serviços médicos pesados, por exemplo Oncologia. Em não estou a ver IPOs em cada autarquia nem a constituirem-se associações ad-hoc para esse fim. Este exemplo liga com o tipo de povoamento a Norte. É muito disperso, existindo muitas pequenas aldeias e lugares não urbanizados, muito diferente do que ocorre a sul, Espanha ou resto da europa. Depois criam-se expectativas que cada um desses lugares terá serviços como uma grande cidade, contra toda a racionalidade económica. A t´tilo de exemplo, em Londres existem 5 hospitais centrais para servir os mesmos 10 000 000 de pessoas que vivem em Portugal. O povoamento disperso vai acabar mais cedo do que julgamos. Com o petroleo estruturalmente caro e carencia de ferrovias, os lugares menos centrais, TMAD fora do eixo VReal-Bragança ou Viseu-Chaves, a região do Basto, o ALto Minho e Douro ficarão inevitavelmente mais caros para chegar lá produtos e pessoas. Viver lá será mais caro e a desertificação se acelerará.
Pode haver lugar a mais descentralização para 318 autarquias, para território fragmentado, por exemplo na gestão do parque escolar, como o governo actual está a fazer. Mas continuo a achar que existem bastantes problemas que só lá vão com entidades superiores. É normal e saudável que assim seja. Uma solução exquível é dar mais poder às freguesias actuais e fundir autarquias. Criariamos os 3 níveis de administração pública, sem grande stress.
Há lugar p
Infelizmente, Portugal é um dos países onde a corrupção ao nivél autárquico é dos mais altos. Será possivél a mudança desta cultura de oportunismo? O facto dos autarcas estarem mais perto do eleitorado que o governo central, não muda isto. Na minha opinião independetemente do modelo organisativo, este é o nosso maior problema.
Caro sguna,
Não sei porque todos pactuamos com esse mito, fomentado pelo centralismo, de que a corrupção autárquica é uma desgraça em Portugal. Não conheço quaisquer provas disso. Creio até que estatísticamente é o contrário: há muito mais políticos autárquicos do que centrais; pouco ou nada se sabe sobre a corrupção, tráfego de influèncias e abusos de poder, ao nível central. Mas todos conhecemos e sentimos as consequências das más decisões do poder central, seja no desordenamento do território, seja no mau planeamento das infraestruturas de transporte, etc. E aí, os erros não são às dezenas ou às centenas...
Pelo contrário, a mim consola-me saber que a corrupção autàrquica, que não me parece excessiva, vai sendo apanhada e punida; que os seus erros raramente hipotecam mais do que um conselho; que apesar de tudo é rara e a níveis relativamente baixos; que os seus erros raramente sejam irreversíveis. Quanto desejaria poder dizer o mesmo do poder central...
Enviar um comentário