20090909

Reabrir ao Tráfego Ferroviário o Douro Internacional (IV)

(Nota de José Silva: Republicação de artigo originalmente publicado pelo Prof Manuel Tão em Junho de 2007)

Antes de prosseguirmos com o desenvolvimento do cenário de reabilitação integral da Linha do Douro ao tráfego internacional de mercadorias – sem prejuízo da sua valência de passageiros e turística, a qual pode ser ainda melhorada em maior expressão – torna-se imperioso rebater a mistificação que ao longo de muitos anos se vem fazendo quanto a uma alegada “incapacidade” de se processarem tráfegos de carga através da chamada “Garganta do Águeda”, comportando a secção de 18 Km entre as estações de Barca de Alva e Fregeneda, onde existem rampas de 20 Milésimas e curvas de raio mínimo da ordem dos 350 m.

Isto é uma mentira e uma falácia técnica grosseira, que, escamoteando a tecnologia ferroviária actual, e as práticas de numerosos exemplos estrangeiros (e nacionais!), vem-se mantendo, alimentada por círculos ligados ao caminho de ferro, designadamente empresas do sector controladas pelo Estado Português, e a quem não tem interessado uma política de desenvolvimento de uma verdadeira rede ferroviária, comportando itinerários alternativos. Muitas vezes, são esses mesmos “especialistas” que depois vão dizer maravilhas dos Caminhos de Ferro Suíços, onde linhas como o Saint Gothard, assegurando os tráfegos de mercadorias mais intensos de toda a Europa, possuem pendentes contínuas de 28 Milésimas.

Mas nem necessitamos de ir tão longe. Basta ver o que é a linha principal de Madrid para as Astúrias entre as estações de Busdongo e Ujo, na Cordilheira Cantábrica, onde há um desnível de mais de 800 m em 49 Km, com um gradiente contínuo de 22 Milésimas e curvas de raio mínimo que chegam aos 200 m. Pois é nessa mesma linha que todos os dias passam comboios de mercadorias com contentores, com bobinas de aço das siderurgias de Veriña para toda a restante Espanha, e comboios de carvão provenientes das minas Asturianas (alguns dos quais até já são operados por privados, como a “Acciona Rail, SA”). E passam lá todos os dias TALGOs e ICs. E que dizer da linha principal de RENFE de Linares e Moreda para Almería? Com rampas de 27 Milésimas? Onde passam composições de minério, de contentores e tráfego de passageiros como o TALGO Almería-Madrid ou automotoras TRD Granada-Almería?

E dentro de Portugal? A linha Ermidas-Sado ao Porto de Sines, onde passam os comboios de carvão de 2250 toneladas de carga bruta rebocada (25 tremonhas de 90 toneladas), possui entre S.Bartolomeu e Santiago do Cacém rampas de 20 Milésimas. A própria linha Lisboa-Porto, entre a estação de Albergaria dos Doze e Litém, comporta uma rampa contínua de 18 Milésimas (pela lógica de certos “peritos”, não deveria existir tráfego de mercadorias entre Lisboa e o Porto...). A Linha da Beira Alta, de Pampilhosa a Mortágua (30 Km) é practicamente em rampa continua de 18 Milésimas, e é por lá que transitam muitas composições de mercadorias entre Lisboa (e até o Porto) e Vilar Formoso, pelo menos até à altura de – no que toca a Lisboa – a Linha da Beira Baixa oferecer uma alternativa mais curta em 50 Km. A Linha da Beira Baixa, no troço de Covilhã à Guarda também possui rampas de 20 Milésimas. Mas não é por isso que lá não passam composições de mercadorias há bastante tempo. É antes, pelo facto de as obras de arte metálicas estarem limitadas a uma carga por eixo máxima de 16 Toneladas, prevendo-se o seu reforço para 25 Ton/eixo pela REFER até 2010, de molde a completar-se a electrificação de Castelo Branco à Guarda. Não será este, o problema do reforço das pontes metálicas, o mesmo que afecta os 106 Km de linha, do Pocinho a Barca de Alva e Fuente de San Esteban? Então se esse mesmo reforço já se fez na Linha da Beira Alta nos anos cinquenta e sessenta; já se fez da Régua até ao Pocinho nos anos oitenta e noventa; vai fazer-se agora no troço Covilhã-Guarda da Linha da Beira Baixa, e não se pode fazer, em moldes exactamente idênticos nas treliças e vigas principais dos viadutos metálicos do Pocinho a Fuente de San Esteban??? Há algum argumento técnico em contrário? Francamente, não parece convincente, tal como a “história da carochinha” do “perfil inadequado ao tráfego de mercadorias”...

MMT

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