20080510

Histórias de jovens e qualificados emigrantes do Norte 6

Ana, Licenciada em Jornalismo. Barcelona (a caminho de Berlin)
Antes de começar a contar a minha "história", queria apenas referir como fiquei a conhecer este projecto; no primeiro fim-de-semana de Novembro encontrei a referência numa notícia do JN. Depois de espreitar, li, ávida e consecutivamente, todos os testemunhos aqui presentes e como tudo na vida, identifiquei-me mais com uns do que com outros.
E passemos então à minha recente situação, de momento trabalho em Barcelona, estou aqui há quase 7 meses. Cheguei a 6 de Maio de 2007 com armas e bagagens e mal preparada para os muitos degraus das estações de metro (ou a minha mala é que era demasiado grande).
Pelo que li até agora, parece-me que a minha situação é um bocadinho diferente. Não me incluo na categoria de quadros de excelência que está a abandonar o País. Licenciei-me em Jornalismo e Ciências da Comunicação sem grandes atribulações, sou, por isso, uma estudante e uma profissional normal. Desde os primeiros tempos de juventude que queria ter uma experiência fora do País, não sei bem por que sempre existiu isto em mim; não há grandes exemplos na família nem nunca viajei muito nos tempos de meninice. Mesmo assim, esta vontade sempre foi uma certeza, uma certeza de sonho que queria cumprir. Falhei o programa Erasmus por estupidez, na altura não quis arriscar perder um ano da faculdade e os gastos pareciam-me excessivos, especialmente sem a bênção paterna. Terminei o curso sem nenhuma experiência internacional e as viagens realizadas sob os auspícios da família nunca me levaram além do Algarve - a Sul ou de Paris – a Este.
Fruto das aulas que tive no Instituto de Alemão, já que a licenciatura na UP não compreendia a obrigatoriedade de nenhuma Língua Estrangeira, pude concorrer a uma bolsa de uma instituição alemã, DAAD, que ganhei. Consistiu essa bolsa na oferta de um curso de Alemão na Alemanha e, por motivos de saúde, não pude viajar no ano em que me foi atribuída, 2004. Eu acredito muito na sorte ou, por outras palavras, no que podemos fazer com a alteração de planos previamente estabelecidos e, pensamos nós, definitivos. Ter a oportunidade de estar na Alemanha depois de finalizar o curso acabou por permitir outras coisas, encarei toda a experiência como as férias e a recompensa merecidas, não pensei em procurar trabalho ou o que fosse, ia ter a minha aventura e, para não perder nada, lá decidi ficar mais duas semanas a explorar um pouco depois das aulas terminarem.
Podia escrever muito sobre o que se ganha neste tipo de experiências; o perceber que há mundos para além do nosso e que há formas variadas de ver um mesmo mundo; os contactos que ainda mantenho e sobre como ali, em muitos sentidos, me comecei a formar como pessoa. A cidade, Tübingen, também foi um tiro de sorte porque podia ter escolhido qualquer uma, desde que tivesse uma universidade. Gostei da cidade e gostei do curso. E nesse Verão pude acrescentar mais umas quantas paragens ao meu parco currículum, entre elas Berlin e Vienna. Regressada a Portugal, tive de enfrentar todas as preocupações que tentei evitar, as minhas e as dos pais. Encontrar trabalho (ou emprego), fazer alguma coisa. E eu lá enviei uns currículos mas nunca sem exagerada preocupação porque já conhecia o tempo médio de espera e apesar de me interessar por Jornalismo cada vez me via menos capaz de entrar na área, não só pela pouca oferta mas também pelo que era pago. Ao fim de uns dois meses estava a fazer umas traduções numa empresa de um amigo, era a recibos verdes mas sempre me mantinha ocupada e permitia-me respostas menos simpáticas nas entrevistas de emprego que, até hoje, não vejo como falta de humildade.
Devido, mais uma vez, aos conhecimentos de línguas lá arranjei um trabalho na TAP, ou melhor na Groundforce, que é uma participada da TAP. Eu não quero precisar valores, adianto, contudo, que o meu contrato era de 25 horas semanais e ganhava tanto ou mais do que recém-licenciados a trabalhar 40 horas, excluindo as horas extra que eram pagas a peso de ouro. Era uma situação estranhamente vantajosa. Assinei um contrato de 6 meses que depois renovei por mais 12, ao fim de 7 meses fui aumentada em 80 euros quando todo o País falava em crise e o Governo oferecia aumentos de 0.5 por cento à Função Pública.
Encontrava-me no que alguns consideram uma boa posição, a probabilidade de renovar contrato mais uma ou duas vezes e passar aos quadros era elevada. Então porque decidi rescindir o contrato apenas a uns dias de cumprir um ano na empresa e vir para Barcelona?
Mais do que questões financeiras ou profissionais vim por razões pessoais, acho que o Porto é muito pequeno e não me imaginava a iniciar a vida burguesa que me esperava. O trabalho era muito aborrecido e as poucas capacidades que tenho não estavam a ser aproveitadas. A estrutura da empresa em si já dificultava qualquer mudança ou melhoria de posto, por isso ou continuava a fazer o que fazia ou ao fim de uns anos, se tivesse sorte, supervisionava outros tantos como eu. Sendo do Porto, as possibilidades de aceder a postos mais interessantes estavam ainda mais dificultadas. Não se esqueçam que a metrópole é Lisboa, portanto, ou se é de lá ou se está lá ou se vai para lá…
Já andava há uns tempos a dizer que não podia passar ali outro Verão e os meus desejos cumpriram-se. Recusaram-me num estágio em Estugarda mas fui aceite noutro em Barcelona. O que faço continua a não ser muito interessante e está bastante longe da minha área de formação, suponho que o facto de falar diariamente duas línguas que não a minha, Espanhol e Inglês, a empresa é inglesa, torna a rotina do quotidiano mais cosmopolita, pelo menos por agora. E também porque, findo o prazo do estágio, me convidaram para ingressar os quadros da empresa. Apesar disso, não me imagino a ficar nesta cidade muito tempo, aliás o meu "deadline" pessoal é Setembro de 2009 e estou a apontar a mira para Berlin ;)
Gostava também de deixar um testemunho um pouco diferente dos demais, sobretudo porque até agora tudo parece bastante floreado e há dificuldades inerentes ao abandono de Portugal. No meu caso particular os primeiros meses foram complicados do ponto de vista da despesa. Tive a sorte de estar numa empresa decente e que por isso me pagava o estágio. Valor esse que era manifestamente insuficiente para sobreviver em Barcelona, onde a especulação imobiliária tornou o preço dos quartos absolutamente ridículo. Essa fase correu bem e ao fim de umas semanas estava a viver num quarto a sério, ou seja, com luz natural e com mais de 3 metros quadrados e, ainda por cima, no centro da cidade.
Passado este obstáculo pôs-se-me a questão do "Dia de S. Receber" e acabei por encontrar um part-time aos fins-de-semana que me ajudou a não ter de contar os trocos no supermercado. Nesse primeiro mês em terras catalãs andava bastante orgulhosa das minhas conquistas e descobri capacidades que nunca tive oportunidade de testar no Porto.
No entanto, em Barcelna não se vive necessariamente bem e a geração dos "mil euros" – mileuristas, como lhe chamam aqui em Espanha, tem muitas das mesmas dificuldades que nós em Portugal. A diferença, claro está, é o valor pelo qual somos conhecidos; nós somos, só, a geração dos 500 euros. Há custos mais elevados aqui mas eu comparo-os com os do Porto e, pelo que sei, Lisboa tem vindo a conhecer a sua dose de inflação. Na minha actual situação, tão pouco me posso aventurar ou, sequer pensar, em estabelecer-me em Barcelona com casa, carro e afins. As dificuldades seriam, provavelmente, maiores do que em Portugal. Há, obviamente, mais oferta de trabalho por aqui, o que também se explica pela elevada atracção turística que a cidade exerce. Na altura do Verão só não arranja um part-time ou quem não quer ou quem não fala Inglês.
Creio que a minha experiência fora de Portugal está longe da sua recta final, apesar de não querer continuar por aqui, gostava de experimentar outros rumos, e até usufruir da ajuda do programa ICEP – Contacto, ao qual insisto em candidatar-me, apesar de, pelos relatos que ouvi/li, o factor C ser de extrema importância para garantir um "lugar ao sol". (Talvez algum de vocês me possa esclarecer...)
Ao contrário de algumas das pessoas que deixaram aqui o seu testemunho, também não desejo ficar demasiado tempo fora de Portugal. Compreendo que tudo dependerá das ofertas que for encontrando e também do meu limite pessoal para aguentar as saudades. E o factor mais determinante, a realidade que me espera em Portugal. Ainda assim, e sabendo de todos estes obstáculos, o objectivo a longo prazo é o regresso à Pátria.
Sendo do Porto, uma cidade que por agora, e infelizmente, está estagnada, mais necessidade tenho de voltar. Não quero pensar que abandonei a minha cidade, ainda mais quando acredito que tem muita potencialidade. Queria contribuir com algo para o seu desenvolvimento. Mas todos os meus planos dependem de muitos factores que desconheço e que não controlo, de qualquer forma pretendo experimentar mais um pouco e tentar tornar essa experiência adquirida numa mais-valia pessoal e profissional.
Até agora não me arrependo, as saudades suportam-se bem com a ajuda das novas tecnologias e o que custa mais é descobrir que antigas amizades não sobrevivem à distância, ao passo que novos laços, bem fortes, se criam num ápice. Sou portuguesa e cada vez me sinto mais uma cidadã do mundo, mundo esse que começo agora a explorar. E ainda bem que sempre tive curiosidade em aprender outras Línguas!!!
Boa sorte para os que estão fora e para os que estão quase, quase a dar o salto. Difícil é começar. ;)

3 comentários:

  1. Sugiro que se coloquem botões de controlo no vídeo que está em permanência colocado no blog.

    Torna-se incomodativo por vezes, para quem está interessado no essencial deste excelente blog!

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  2. Cara Ana,

    Sem prejuízo das experiências internacionais de que está a beneficiar, e que são sem dúvida enriquecedoras, deixe-me dizer-lhe que num País decente, consciente da escassez dos recursos humanos, certamente que teria encontrado oportunidades mais gratificantes do que aquelas que descreve. Ou pelo menos, o mérito de que dá exemplos teria sido identificado e algumas perspectivas de progressão e aproveitamento das suas capacidades teriam sido apresentadas...

    Em tudo nesta vida é preciso sorte; mas a sorte também se procura. Não tenho dúvidas que se continuar disposta a trabalhar acabará por ter sorte.

    Espero que essa sorte lhe proporcione as experiências que precisa para poder vir a contribuir para o desenvolvimento desta nossa cidade que é o Porto, e que tanto necessita. Estou seguro que o conseguirá.

    É possível um Portugal melhor. Basta querer. E, pelo que leio, a Ana quer.

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